Tornarmo-nos esfinges, ainda que falsas, até chegarmos ao ponto de já não sabermos quem somos. Porque, de resto, nós o que somos é esfinges falsas e não sabemos o que somos realmente. O único modo de estarmos de acordo com a vida é estarmos em desacordo com nós próprios. O absurdo é o divino.
Estabelecer teorias, pensando-as paciente honestamente, só para depois agirmos contra elas – agirmos e justificar as nossas acções com teorias que as condenam. Talhar um caminho. Ter todos os gestos e todas as atitudes de qualquer coisa que nem somos, nem pretendemos ser, nem pretendemos ser tomados como sendo.
Comprar livros para não os ler; ir a concertos nem para ouvir a música nem para ver quem lá está; dar longos passeios por estar farto de andar e ir passar dias no campo só porque o campo nos aborrece.
(trecho 23 do 'Livro do Desassossego')
Nenhum comentário:
Postar um comentário