Caio Fernando Abreu

"Depois de todas as tempestades e naufrágios, o que sobra de mim em mim é cada vez mais essencial e verdadeiro." Caio Fernando Abreu

12 janeiro 2009

Profissão – Mãe

Ela foi renovar seu documento, pediram-lhe para informar qual era a sua profissão, hesitou, sem saber bem como se classificar.
"O que eu pergunto é se tem um trabalho", insistiu o funcionário."
Claro que tenho um trabalho", exclamou . "Sou mãe". 
"Nós não consideramos 'mãe' um trabalho. Vou colocar Dona de casa", disse o funcionário friamente. 

Não voltei a lembrar-me desta história até o dia em que me encontrei em situação idêntica... 
A pessoa que me atendeu era obviamente uma funcionária de carreira, segura, eficiente, dona de um título sonante. "Qual é a sua ocupação?" Perguntou. 
Não sei o que me fez dizer isto; as palavras simplesmente saltaram-me da boca para fora: 

"Sou Doutora em Desenvolvimento Infantil e em Relações Humanas." A funcionária fez uma pausa, a caneta de tinta permanente a apontar para o ar e olhou-me como quem diz que não ouviu bem... Eu repeti pausadamente, enfatizando as palavras mais significativas. Então reparei, maravilhada, como ela ia escrevendo, com tinta preta, no questionário oficial. Posso perguntar", disse-me ela com novo interesse, "o que faz exatamente?" Calmamente, sem qualquer traço de agitação na voz, ouvi-me responder: "Desenvolvo um programa a longo prazo (qualquer mãe faz isso), em laboratório e no campo (normalmente eu teria dito dentro e fora de casa). Sou responsável por uma equipa (a minha família) e já recebi quatro projectos (todas meninas). Trabalho em regime de dedicação exclusiva (alguma mulher discorda???), o grau de exigência é em nível de 14 horas por dia (para não dizer 24 horas). Houve um crescente tom de respeito na voz da funcionária que acabou de preencher o formulário, se levantou pessoalmente foi abrir-me a porta. Quando cheguei a casa, com o título da minha carreira erguido, fui recebida pela minha equipa: - uma com 13 anos, outra com 7 e outra com 3. Do andar de cima, pude ouvir o meu mais recente projecto (um bebé de seis meses), a testar uma nova tonalidade de voz. Senti-me triunfante. Maternidade... que carreira gloriosa! Assim, as avós deviam ser chamadas "Doutora-Sénior em Desenvolvimento Infantil e em Relações Humanas". As bisavós: "Doutora- Executiva- Sénior". E as tias: "Doutora - Assistente". (não sei a autoria)

Nenhuma mulher é fantasma

... Ok, uma mulher é apenas uma mulher, mas uma mãe é um vulcão, um furacão, uma enchente, uma tempestade, um terremoto. Uma mãe é invencível. Não há perda que ela não trasnforme em força. Não há passado que ela não emoldure e coloque na parede. Não há medo que a mantenha quieta por muito tempo ... (Martha Medeiros – trecho do livro 'Doidas e Santas' pág. 119)

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