Anjos varriam morcegos
Até jogá-los no mar.
Outros pintavam de azul,
De azul e de verde-mar,
Vassouras de feiticeiras,
Desbotadas tabuletas,
Velhos letreiros de bar.
Era uma carta amorosa?
Ou uma rosa que abrira?
Mas a mão correra ansiosa
- Ó sinos, mais devagar! -
À janela azul e rosa,
Abrindo-a de par em par.
Ó banho de luz, tão puro,
Na paisagem familiar:
Meu chão, meu poste, meu muro,
Meu telhado e a minha nuvem,
Tudo bem no seu lugar.
E os sinos dançam no ar.
De casa a casa, os beirais,
- Para lá e para cá -
Trocam recados de asas,
Riscando sustos no ar.
Silêncios. Sinos. Apelos. Sinos.
E sinos. Sinos. E sinos. Sinos.
Pregoeiros. Sinos. Risadas. Sinos.
E levada pelos sinos,
Toda ventando de sinos,
Dança a cidade no ar!
Caio Fernando Abreu
"Depois de todas as tempestades e naufrágios, o que sobra de mim em mim é cada vez mais essencial e verdadeiro." Caio Fernando Abreu
11 janeiro 2009
Soneto I
Quando olho para mim não me percebo.
Tenho tanto a mania de sentir.
Que me extravio às vezes ao sair
Das próprias sensações que eu recebo.
Tenho tanto a mania de sentir.
Que me extravio às vezes ao sair
Das próprias sensações que eu recebo.
O ar que respiro, este licor que bebo,
Pertencem ao meu modo de existir,
E eu nunca sei como hei de concluir
As sensações que a meu pesar concebo.
Nem nunca propriamente reparei
Se na verdade sinto o que sinto. Eu
Serei tal qual pareço em mim? Serei
Tal qual me julgo verdadeiramente?
Mesmo ante as sensações sou um pouco ateu,
Nem sei bem se sou eu quem em mim sente. [agosto de 1913]
(Poemas de Álvaro de Campos)
Mal-entendido
O mundo funciona graças ao mal-entendido. É mediante o mal-entendido universal que todos concordam. Pois, se, por falta de sorte, as pessoas se compreendessem umas às outras, jamais concordariam. (Baudelaire – 1867)
Imitação
Cada um traz dentro de si um reservatório de frases, epítetos e locuções prontas que resultam de pura imitação. Elas nos livram do trabalho de pensar porque a tomamos como soluções válidas e apropriadas. Na maior parte das vezes, reagimos ao que nos acontece usando palavras que não são nossas. Não somos os seus reais autores. [...] É por isso que não devemos acreditar rápido demais em nossas próprias palavras. (Paul Valéry – 1935)
Meu mundo caiu
Maysa
E me fez ficar assim
Você conseguiu
E agora diz que tem pena de mim
Não sei se me explico bem
Eu nada pedi
Nem a você nem a ninguém
Não fui eu que caí
Sei que você me entendeu
Sei também que não vai se importar
Se meu mundo caiu
Eu que aprenda a levantar
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