Talvez seja tão simples, tolo e natural que você nunca tenha parado para pensar: aprenda a fazer bonito o seu amor.
Ou fazer o seu amor ser ou ficar bonito. Aprenda, apenas, a tão difícil arte de amar bonito. Gostar é tão fácil que ninguém aceita aprender. Tenho visto muito amor por aí, Amores mesmo, bravios, gigantescos, descomunais, profundos, sinceros, cheios de entrega, doação e dádiva, mas esbarram na dificuldade de se tornar bonito. Apenas isso: bonitos, belos ou embelezados, tratados com carinho, cuidado e atenção. Amores levados com arte e ternura de mãos jardineiras.
Aí esses amores que são verdadeiros, eternos e descomunais
de repente se percebeu ameaçados apenas e tão somente
porque não sabem ser bonitos: cobram; exigem;
rotinizam; descuidam; reclamam; deixam de compreender;
necessitam mais do que oferecem; precisam mais do que atendem;
enchem-se de razões. Sim, de razões. Ter razão é o maior perigo no amor.
Quem tem razão sempre se sente no direito (e o tem) de reinvindicar,
de exigir justiça, equidade, equiparação, sem atinar que o que está
sem razão talvez passe por um momento de sua vida no qual não
possa ter razão. Nem queira. Ter razão é um perigo: em geral enfeia o amor, pois é invocado com justiça mas na hora errada. Amar bonito é saber a hora de ter razão.
Ponha a mão na consciência. Você tem certeza que está fazendo o
seu amor bonito? De que está tirando do gesto, da ação, da reação,
do olhar, da saudade, da alegria do encontro, da dor do desencontro,
a maior beleza possível? Talvez não. Cheio ou cheia de razões,
você espera do amor apenas aquilo que é exigido por suas partes
necessitadas, quando talvez dele devesse pouco esperar, para
valorizar melhor tudo de bom que de vez em quando ele pode trazer.
Quem espera mais do que isso sofre, e sofrendo deixa de amar bonito.
Sofrendo, deixa de ser alegre, igual criança.
E sem soltar a criança, nenhum amor é bonito.
Não tema o romantismo. Derrube as cercas da opinião alheia.
Faça coroas de margaridas e enfeite a cabeça de quem você ama.
Saia cantando e olhe alegre. Recomendam-se: encabulamentos; ser pego
em flagrante gostando; não se cansar de olhar, e olhar; não atrapalhar a
convivência com teorizações; adiar sempre, se possível com beijos,
“aquela conversa importante que precisamos ter”, arquivar se possível,
as reclamações pela pouca atenção recebida. Para quem ama toda
atenção é sempre pouca. Quem ama feio não sabe que pouca atenção
pode ser toda atenção possível. Quem ama bonito não gasta o tempo
dessa atenção cobrando a que deixou de ter.
Não teorize sobre o amor (deixe isso para nós, pobres escritores que
vemos a vida como criança de nariz encostado na vitrine, cheia de
brinquedos dos nossos sonhos): não teorize sobre o amor, ame.
Siga o destino dos sentimentos aqui e agora.
Não tenha mêdo exatamente de tudo o que você teme, como:
a sinceridade; não dar certo; depois vir a sofrer (sofrerá de
qualquer jeito); abrir o coração; contar a verdade do tamanho
do amor que sente.
Jogue pro alto todas as jogadas, estratagemas, golpes, espertezas,
atitudes sabidamente eficazes (não é sábio ser sabido): seja
apenas você no auge de sua emoção e carência, exatamente
aquele você que a vida impede de ser.
Seja você cantando desafinado, mas todas as manhãs.
Falando besteiras, mas criando sempre. Gaguejando flores.
Sentindo o coração bater como no tempo do Natal infantil.
Revivendo os carinhos que instruiu em criança.
Sem mêdo de dizer, eu quero, eu gosto, eu estou com vontade.
Talvez aí você consiga fazer o seu amor bonito, ou fazer bonito o
seu amor, ou bonitar fazendo seu amor, ou amar fazendo o seu amor
bonito (a ordem das frases não altera o produto),
sempre que ele seja a mais verdadeira expressão de tudo o que
você é e nunca, deixaram, conseguiu, soube, pôde, foi possível, ser.
Se o amor existe, seu conteúdo já é manifesto.
Não se preocupe mais com ele e suas definições.
Cuide agora da forma. Cuide da voz. Cuide da fala.
Cuide do cuidado. Cuide do carinho.
Cuide de você. Ame-se o suficiente para ser capaz de
gostar do amor e só assim poder começar a tentar fazer o outro feliz.
(Arthur da Távola)
Nenhum comentário:
Postar um comentário